CLUBES E POLÍTICA #14 – LAZIO

A seção “Clubes e Política” dessa semana vai falar da Lazio. É fato que, para não ser tão injusto, desta vez a seção poderia se chamar “torcidas e política”, pois o que representa a ligação do futebol laziale com a ultradireita italiana e europeia é, em grande parte, os seus Ultras, conhecidos como “Irriducibili”, ou “Os Irredutíveis”. Mas é inevitável que a imagem do clube também acabe sendo ligada a essa posição política. Vamos juntos saber mais dessa ligação.

Os Irriducibili são considerados a torcida mais fascista da Europa. Suas manifestações são bem abertas: são cânticos, gritos e faixas declaradamente pró-fascismo, antissemitas, racistas e xenófobos. Apesar de ter sido fundada em 1987, considera-se que a origem da torcida pertence ao próprio Mussolini.

O ditador, nas décadas de 20 e 30, costumava comparecer aos jogos da Lazio e era torcedor declarado do clube. Com o tempo, a Curva Nord do Estádio Olímpico foi ocupada por essa torcida ultra, que depois se institucionalizou como movimento. Isso acabou se tornando tradicional e de certa forma aceito pelo clube, pelo restante da torcida e também pelos adversários.

As demonstrações nojentas dessas posições políticas são inúmeras: na faixa da foto de capa desta publicação, os dizeres são “Auschwitz vossa pátria, os fornos suas casas”. É algo terrível até de digitar. E foi aceito como uma manifestação pública no futebol.

Algo também chocante foram as fotos de Anne Frank, criança judia que morreu nos campos de concentração, com a camisa da Roma, com insultos. De fato, a posição da torcida da Roma, rival da cidade, mais ligada aos trabalhadores, à parte pobre da cidade e aos judeus, fez com que os Irriducibili se tornassem ainda mais extremistas.

Em 2005, em episódio que teve bastante repercussão, o atacante Paolo Di Canio, em um clássico contra a Roma, fez um gol e comemorou com a saudação nazista em direção à Curva Nord. O ato foi comemorado pelos torcedores. O jogador recebeu uma pequena multa de 10 mil euros. Depois, em um programa de TV, o jogador, ídolo laziale, mostrou uma tatuagem em homenagem a Mussolini

O movimento dos Ultras laziale cresceu e se tornou influente na política italiana. Já foram descobertas suas ligações com a Máfia, com movimentos sociais neofascistas e também com o movimento político do chamado “Movimento 5 Estrelas”, que formou a coligação de direita conhecida como “Liga Norte”, que governou a Itália por dois mandatos.

Aliás, uma grande crítica que se faz aos italianos é em relação à tolerância da sociedade com manifestações fascistas. Ainda há ruas, prédios e monumentos que homenageiam representantes do período fascista, e não é raro ver manifestações no Parlamento com elogios a Mussolini.

Não há, portanto, como houve na Alemanha, uma campanha social antinazista e antifascista. Isso contribui para que movimentos e torcidas assim cresçam e se manifestem ainda mais.

Os Irriducibili, inclusive, são uma empresa. Aproveitam-se das cores e da história da Lazio para criar produtos e lojas; em outras palavras, são uma grife. O clube tentou algumas vezes se separar dessa imagem: chegou a fazer uma campanha contra o antissemitismo, em que os jogadores entraram em campo com camisas pedindo o fim dessas manifestações e com a foto de Anne Frank.

Mas é difícil ignorar a tolerância e até o apoio que houve por parte do clube a esses torcedores durante sua história.

Em fevereiro de 2019, algo aconteceu que parece ser uma boa notícia: Os Irriducibili anunciaram o encerramento de suas atividades. Disseram em seu comunicado que a organização não aguentava mais as restrições às suas manifestações e conteúdos e por isso estavam extintos enquanto instituição.

Mas vários jornalistas italianos já nos chamam a atenção: há outra organização, ainda maior, sendo criada, chamada “Ultras Lazio”, que pretende unir de forma ainda mais organizada os movimentos fascistas laziale.