É muito difícil começar a escrever um texto sobre alguém quando você sabe já desde o começo que ele não estará à altura de seu homenageado. Esse é o tamanho de Diego Maradona. Mas vou tentar.
Nasci em 1988. Logo, como vários da minha geração, comecei a acompanhar futebol para valer na Copa do Mundo de 1994, com 6 anos. Completei o álbum, assisti quase todos os jogos, sabia a escalação da Bulgária e da Romênia. E é claro que o título do Brasil foi marcante. O pênalti para fora do Baggio. Mas tem uma outra imagem que ficou muito marcada.
Uma troca de passes como eu nunca tinha visto. Os caras cabeludos, raçudos, vestindo azul e tabelando. Um golaço, para mim o mais bonito daquela Copa. Argentina 4-0 Grécia. O autor do gol, com o número 10 às costas, sai gritando como um louco. Encontra a câmera e quase encosta a boca nela, gritando, parecia querer dizer ao mundo todo a sua mensagem.
Ele era, descobri depois, Diego Armando Maradona. O fim daquela Copa foi melancólico. Pego no antidoping, ele deixou a seleção argentina sem chão, eliminada pela Romênia de Hagi e Dumitrescu. Aquele gol foi o último dele com a camisa de seu país.
No ano seguinte, 1995, vi meu time ser vice-campeão brasileiro, perdendo o título por causa de um juiz. Eu queria gritar, como aquele louco gritou em 1994. É isso, percebi, que o futebol desperta. É a sua essência. Em outras palavras, Maradona me ajudou a sentir e entender o futebol pela primeira vez.
Essa paixão só cresceu em mim com o tempo. Mas esse mesmo tempo só me trazia coisas estranhas sobre aquele louco. Uma rivalidade um tanto mesquinha, de certa forma inventada pela mídia, fez com que só me fosse apresentado o lado ruim da loucura daquele camisa 10. Drogas, arrogância, violência…mas não…aquele louco não podia ser só isso.
Veio a juventude, veio a tecnologia e a curiosidade. Conheci a reverência de um povo pelo futebol. Um povo que ama não só as vitórias, mas que ama o esporte, suas canchas e seus ídolos. Acima de toda essa reverência, ele: Diego Armando Maradona. Ou, para os hermanos, “El D10s”.
Assisti vários jogos completos dele. Vários vídeos com lances, dribles e golaços. Joguei com ele nos primeiros videogames de futebol, no Super Nintendo, ele e Caniggia, loiros, driblando todo mundo com a camisa do Boca.
Ganhei um ídolo.
Vi todos os jogos da Argentina na Copa de 1986. Vi as 5 assistências (melhor da Copa), os 5 gols, os 53 dribles (maior número da Copa), as 27 chances criadas (maior da Copa). Vi o maior gol da história das Copas, contra a Inglaterra nas quartas de final. Vi também a malandragem, o jeitinho e a mágica da mão. Entendi depois a importância daquele jogo, em meio a um conflito entre Argentina e Inglaterra pelas Ilhas Malvinas (nunca serão Falkland!).
E vi Maradona levantar a taça. Entendi o que foi a maior atuação de um jogador em uma Copa do Mundo.
Conheci também um craque que compreendia a relação entre futebol e política. Que pensava no bem de seu povo e nunca deixou de usar sua divindade para dizer suas posições ao povo argentino. Peitou a FIFA, peitou a AFA, peitou dirigentes, peitou presidentes…tudo com carisma. Como dizia Che, que ele traz tatuado na pele, “sem perder a ternura jamais”.
Um carisma marcante, uma generosidade incomum, uma humildade terna em admitir erros…enfim, alguém como a gente. Uma divindade humana. Como diz a famosa frase argentina, “Messi é quem todo argentino gostaria de ser. Maradona é quem a gente é”.
Vá em paz, Dieguito!