Estamos no início de 1991. Poucos dias antes, o Corinthians havia ganhado seu primeiro campeonato brasileiro. E foi logo em um clássico contra o São Paulo. 1-0 com 100 mil pessoas no Morumbi, gol de Tupãzinho.

Apesar do gol ter sido do talismã da Fiel, o grande nome daquele time era Neto, hoje comentarista e apresentador da Band. Tido por muitos como o melhor jogador do Brasil naquele momento e desejado por todos na seleção na Copa de 1990 (Sebastião Lazaroni não o levou), Neto resolveu curtir suas férias de um jeito diferente, mais uma de nossas histórias pouco contadas

Pelada na cadeia

Na época não existiam ainda os jogos festivos de “Amigos de X” contra ‘Amigos de Y’. A boleirada formava times, misturando jogadores do presente com craques do passado, e jogavam entre si. Um desses times era os “Milionários”, que tinha Neto como estrela e contava com caras como Zé Maria e César Maluco.
No Carandiru, a pelada entre os detentos era semanal. E no fim do ano, havia a tradição de formar a seleção do presídio, os melhores entre os mais de 8.000 presos. Quando formou-se essa seleção em 1991, decidiram desafiar os ‘Milionários’. E o desafio foi aceito.
Dá pra ver nas fotos que foi o evento do ano. As fotos e o próprio Neto dizem: mais de 4.000 detentos acompanhavam o jogo ali, do lado do campo. E o restante estava nas janelas das celas, incentivando os companheiros. Afinal, o time dos presos tinha, obviamente, a vantagem de jogar em casa.

Apesar do ambiente de pressão, Neto conta que os jogadores do Milionários foram muito respeitados. Não houve xingamentos ou ameaças. Foram tratados como reis e fizeram até um tour com o diretor pelo presídio, conhecendo a estrutura e as celas.

Neto

Neto no Carandiru
Reprodução: Internet

Neto faz na cadeia o que fazia no campo

Isso durou até…o apito inicial.

O jogo não foi nada amistoso, foi pegado e bem disputado. No final, o craque do momento decidiu: 2-0, dois gols de falta de Neto.

Não houve violência, o único que sofreu foi o goleiro dos detentos: “Depois os caras ‘raparam todo o pelo’ do goleiro porque ele não podia ter tomado dois gols de falta”, disse Neto. Teve até comemoração, premiação e tudo mais.
Mas, no fim, o medo acabou vencendo. Com tantos detentos juntos, Neto achou que poderia começar uma rebelião, aproveitando a presença deles ali. Acabou passando mal e chegou a desmaiar. Foi parar no hospital com agulha de glicose no braço.
Pouco mais de um ano depois, aconteceu o Massacre do Carandiru. Depois da final do campeonato de futebol do presídio, 111 presos foram mortos pela Tropa de Choque da PM no Pavilhão 9. O julgamento que condenou os policiais que participaram do massacre foi anulado em 2017.