A seção “Histórias Pouco Contadas” volta para falar sobre o racismo na Bundesliga, a reação da Alemanha a isso enquanto nação e a teimosia do mundo do futebol em aceitar manifestações racistas.
Esse da foto é Erwin Kostedde. Primeiro negro a jogar pela seleção alemã, ele foi um ótimo atacante que passou por Werder Bremen e Borussia Dortmund, entre outros clubes, na década de 1970. O cara marcou quase 300 gols na carreira.

Erwin Kostedde com a camisa da Alemanha Ocidental

Kostedde injustiçado

Já no início da década de 1990, após a unificação da Alemanha, o país – e com isso também o futebol alemão – passava por um período de dificuldades, com muitos casos de xenofobia e racismo.
Nesse contexto, Kostedde, já aposentado, foi acusado de roubar uma loja de vídeos. A lei alemã dizia que tinham que ser apresentados ao menos 5 suspeitos para a testemunha identificar. Mas no caso, só Kostedde estava na sala de reconhecimento, pois a testemunha havia identificado o ladrão como negro. Os policiais disseram que só Kostedde era negro nas proximidades do local, ou seja, seria impossível encontrar 5 pessoas para o reconhecimento.
Kostedde foi apontado e preso.
6 meses depois, descobriram sua inocência. Kostedde foi solto, mas nunca mais foi o mesmo. Recebeu de indenização 3 mil marcos, valor irrisório.

Kostedde, o primeiro negro a jogar na Alemanha Ocidental; e Asamoah, o primeiro negro a jogar na Alemanha unificada.
Fonte: DFK.

A luta contra o racismo na Bundesliga

Após essa situação, e com vários outros casos de racismo acontecendo na Alemanha, dois importantes jogadores tomaram a liderança da iniciativa de um movimento antirracismo na Bundesliga. Eram eles Souleyman Sané (pai do Leroy Sané, hoje no Bayern) e o atacante Yeboah, que brilhou no Hoffenheim e no Hamburgo.
Os 2, juntos com Anthony Baffoe, do Colônia, decidiram escrever uma carta direcionada à imprensa, ao público e à Bundesliga. A carta foi publicada no jornal Bild, de grande circulação. Os jogadores pediam apoio na luta contra o preconceito.
A comunicação foi muito bem aceita no meio do futebol e incentivou diversas campanhas pelo país. Os jogadores chegaram a ser aplaudidos por suas torcidas em alguns jogos.

Grafite em homenagem a Yeboah, em Hamburgo.
Fonte: Trivela.

Antes de Daniel Alves fazer o mesmo jogando pelo Barcelona, Sané, em um jogo contra o Hamburgo, fez um gol e foi comemorar na bandeirinha de escanteio. Quando jogaram bananas na direção dele, ele descascou e comeu.
Um sinal de mudança veio também quando, após sofrer insultos racistas mais uma vez em jogo contra o Hamburgo, Sané recebeu uma carta da torcida pedindo desculpas, assinada por milhares de torcedores.

Sané quebra nariz de racista

Mas o vírus do racismo não vai embora facilmente, e as dificuldades continuaram. Quando Sané chegou ao Nuremberg, um jornalista publicou que ele seria uma contratação problemática para o clube e que os torcedores com certeza cancelariam seus carnês por conta da presença de um negro no time.
O fato de ele se envolver em questões políticas também era considerado pelo imbecil mais um “malfeito” do jogador.
Em uma coletiva, Sané resolveu esperar o jornalista na saída. Depois de muitos minutos sem coragem de passar pela porta onde o jogador estava, o jornalista se aproximou e disse: “Sou livre para escrever o que quiser”.
Sané deu-lhe uma cabeçada que quebrou o seu nariz.
Após o caso, a resistência ao racismo cresceu na Bundesliga. Yeboah participou de campanhas na televisão e a Bundesliga também criou muitos materiais.
A luta ainda continua: há alguns meses ficaram famosas as imagens de jogadores como Thuram, do Monchengladbach e Sancho, do Dortmund, fazendo o gesto em homenagem a George Floyd. Infelizmente, o racismo ainda não está morto na Alemanha, mas a luta segue, em homenagem a personagens como Kostedde e Sané.

Jadon Sancho com camisa em homenagem a George Floyd.
Fonte: Trivela